Carro mais caro é reflexo de uma inflação em crescimento
Ao olhar para o mercado automotivo e aumento dos preços, temos um claro sinal de que nossa economia está retornando a um processo inflacionário, do qual não temos a menor saudade.
Texto original em: Jornal de Brasília.
O aumento acelerado dos veículos dos últimos 12 meses é um sinal claro da inflação que chegou sem data para ir embora.
Foto: Divulgação.
Eu estava me atualizando nas notícias diárias quando me deparei com uma matéria do The Washington Post de título What used cars tell us about the risk of too much inflation hitting the economy (“O que os carros usados nos falam sobre o risco de muita inflação atingir a economia”). Este título faz todo o sentido também para o Brasil.
Ao longo da pandemia da COVID-19, observamos uma forte aceleração nos preços de veículos novos e seminovos. A primeira e mais básica explicação é o aumento do dólar, que chegou a patamares próximos a seis reais. Isso teve um impacto direto na cadeia de produção, uma vez que temos milhares de elementos importados incorporados na produção industrial.
Marcas que operam com veículos importados sentiram ainda mais. Um exemplo foi a KIA. Uma Sportage que custava algo em torno de cento e sessenta mil reais hoje beira os duzentos mil. O pior é que esse aumento, gerado pelo descompasso no câmbio, não veio com melhorias nos veículos. Os preços aumentaram e os produtos são os mesmos.
A inflação tem impacto direto na indústria automotiva e o nos preço final dos produtos para os consumidores.
Foto: Divulgação.
Por outro lado, acredito que a pandemia também aumentou o desejo pelo carro próprio. As ideias de compartilhamento (como UBER, 99, etc) não acabaram, mas recuaram. Ter seu próprio carro para deslocamento e ter o controle da higiene dele pareceu um caminho mais seguro para muitas pessoas. Além disso, viagens de carro em um raio de até 300 quilômetros foram uma opção de lazer na era dos lockdowns. Ou seja, o interesse pelo carro cresceu e os preços deles também.
O carro seminovo, por exemplo, disparou. A tabela FIPE que antes era aplicada em carros de excelente qualidade já não serve de parâmetro. A relação oferta x demanda ficou ainda mais complexa com os estoques de novos e seminovos baixos. Montadoras (como a Chevrolet e Volks) pararam a produção e tivemos problemas até de falta de peças para o pós-venda. Somado a isso, a gasolina chegou a valores absurdos.
Mesmo assim, diante de todo esse cenário, o brasileiro continua comprando carros novos e usados. O mercado ainda está aquecido e os preços também acompanharam o momento. Nos EUA, os valores de carros usados aumentaram em 17% nos últimos 7 meses de 2020 segundo o The Washington Post. Por aqui, muita gente vendeu o carro, ou fez um downgrade para resolver problemas financeiros ao longo da pandemia. O carro é o primeiro bem da classe média em momento de crise. Sua venda é rápida e o dinheiro que entra também.
Alguns amigos me falaram “meu carro valorizou, estou pensando em vender”. Mas o problema é que se você vender (mesmo que seja mais caro), achar outro carro também será mais caro e mais difícil, com a falta nos estoques. Na verdade, seu carro não valorizou. Apenas acompanhou a inflação. Seu carro aumentou de preço, mas a gasolina também, assim como o supermercado.
A inflação é um mal que parece retornar para nossa economia ao longo da pandemia. Atinge primeiro os mais pobres, depois a classe média e se espalha deixando um rastro de destruição na maioria da população. Ao olhar para o mercado automotivo e aumento dos preços, temos um claro sinal de que nossa economia está retornando a um processo inflacionário, do qual não temos a menor saudade. Lembre-se, a inflação fragiliza o país, diminui o poder de compra da população e prejudica a economia.
Muitas pessoas, diante desse cenário, decidiram manter os carros, apenas fazer uma revisão, trocar os pneus, retocar a pintura e, assim, estender o tempo do carro na família. Mas se as peças subiram, a revisão também ficou mais cara. Trocar de carro ficou mais caro e manter o carro em casa também. Esse é o problema da inflação, ela nos coloca no corner, sem ter muito para onde correr.
Não sei qual será a sua decisão, mas para onde você for será uma escolha difícil.